segunda-feira, 21 de maio de 2012

Escolhas


Ganhei um livro, mas estava em falta. Ganhei o crédito para buscá-lo quando chegasse. Não chegou. Esperei, pois o livro foi bem indicado pelo tio que me presenteou. Mas não chegou.
Com o crédito que tinha nas mãos, decidi substituir por outro. Cheguei procurando um, mas queria outro, e apareceu mais outro, mas eu só podia levar um. E por eliminação restou um de técnica fotográfica e outro de poesia. 
Me vi dividida, como se tivesse de escolher entre dois amores. 
De cara, pensei na fotografia... folheei, paquerei, quase levei. Mas a poesia foi quem chegou primeiro na minha vida. Há poesia na fotografia. Peguei "Poesia Completa", do Manoel de Barros, como quem pede a opinião de um poeta. Abri em qualquer página e ele me disse assim:

O  Fotógrafo

Difícil fotografar o silêncio.
Entretanto tentei. Eu conto:
Madrugada a minha aldeia estava morta.
Não se ouvia um barulho, ninguém passava entre as casas.
Eu estava saindo de uma festa.
Eram quase quatro da manhã.
Ia o Silêncio pela rua carregando um bêbado.
Preparei minha máquina.
O silêncio era um carregador?
Fotografei esse carregador.
Tive outras visões naquela madrugada.
Preparei minha máquina de novo.
Tinha um perfume de jasmim num beiral de um sobrado.
Fotografei o perfume.
Vi uma lesma pregada mais na existência do que na pedra.
Fotografei a existência dela.
Vi ainda azul-perdão no olho de um mendigo.
Fotografei o perdão.
Vi um paisagem velha a desabar sobre uma casa.
Fotografei o sobre.
Foi difícil fotografar o sobre.
Por fim cheguei a Nuvem de calça.
Representou pra mim que ela andava na aldeia de braços com Maiakovski – seu criador.
Fotografei a Nuvem de calça e o poeta.
Ninguém outro poeta no mundo faria uma roupa mais justa para cobrir sua noiva.
A foto saiu legal.



- Levei a poesia.

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